Mulheres excepcionais

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Vestidas para vencer

Fernanda Machado, directora-executiva
 da Dress for Success Lisboa
Fernanda Machado, de 36 anos, directora-geral da sua própria microempresa de organização de eventos, a Pé d’Ideias, define-se como uma “mulher normal com uma família excepcional e compreensiva, composta por dois filhos (uma menina de 14 e um rapaz de 10) e um marido fantástico”. Licenciada em Turismo, conta já com 13 anos de carreira profissional desempenhando funções de guia intérprete oficial, técnica de turismo, key account manager e directora de marketing e vendas. 
Fundou e dirige a Dress for Success em Lisboa, uma instituição sem fins lucrativos de origem norte-americana que tem como missão ajudar mulheres sem recursos económicos a vestirem-se de forma adequada a conquistarem um emprego, quebrando o círculo: sem um emprego, como posso comprar um fato? Sem um fato, como posso conseguir um emprego? 

O que é a Dress for Success?
Dress For Success Lisboa é uma organização sem fins lucrativos que oferece serviços para ajudar as nossas clientes a entrarem no mercado de trabalho e permanecerem no emprego.
De que forma, na prática, a Dress for Success ajuda as mulheres?
A instituição recebe roupas adequadas a uma entrevista de emprego, que nos são doadas por parceiros empresariais ou privados – roupas em segunda mão, quase novas e novas. Cada cliente da Dress For Sucess Lisboa recebe um conjunto de roupas adequadas a uma entrevista de emprego. Ao conseguir o emprego, a Dress for Success dá ainda à mulher um enxoval de vestuário completo para que possa estar sempre à altura dos desafios do seu trabalho. O Programa de Grupo de Mulheres Profissionais fornece apoio contínuo para ajudar a cliente a construir uma carreira de sucesso.
Como conheceu a instituição e o que a levou a lançá-la em Portugal? 
Sempre tive imenso gosto em ajudar os outros, e sempre o fiz de forma directa e pessoal. Como não me identificava com nenhuma instituição em especial e o meu bichinho solidário foi crescendo, fiquei à espera... Até que um dia uma pequena reportagem sobre a Dress for Success no famoso programa da Oprah Winfrey (uma das madrinha do projecto nos Estados Unidos da América) acordou o meu interior solidário e finalmente encontrei algo empreendedor e de ajuda directa com um público bastante sensibilizado com todas estas questões da crise: o feminino.
A minha primeira reacção foi entrar em contacto com a instituição em Portugal, doar roupa e candidatar-me como voluntária. Para minha surpresa, descobri que a instituição não existia em Portugal. Pus mãos à obra e candidatei-me para trazer o projecto. Após cerca de 18 meses de exaustivo trabalho e a passagem por várias etapas que me foram levando a outro e outro nível, a 24 de Maio de 2011 fui informada que a minha candidatura fora aceite. Foi o máximo da felicidade. Nem queria acreditar que tinha conseguido realizar o meu sonho de ajudar as mulheres a melhorarem o seu nível de vida profissional e familiar.
De que forma decorreu o processo e que obstáculos encontrou?
A candidatura passou por fases: apresentação do projecto de viabilidade financeira (com todos os requisitos indicados), plano de marketing, plano de comunicação e relações públicas, e angariação de voluntários. O primeiro ano é o mais difícil, pois todos trabalhamos como voluntários, e para demonstrar que a comunidade local e empresarial abraçou a ideia, tenho de apresentar despesas o mais próximas possível dos zero euros, e angariar fundos para que no ano seguintes nos possamos profissionalizar.
Obstáculos financeiros, e de estabelecimento de relações de parcerias com entidades institucionais, corporativas e locais… os obstáculos têm sido alguns, tendo em conta que estamos num ano difícil para a implementação de novos projectos. No entanto este é o momento fulcral para a chegada da Dress for Success a Portugal. Foi fundamental o apoio da Junta de Freguesia de S. José que nos cedeu um espaço gratuitamente, assim como a ajuda do grupo dos voluntários para a implementação do projecto.
Qual o balanço destes meses de actividade? 
Ajudámos a primeira mulher no início de Janeiro, quando ainda não tínhamos aberto portas. Oficialmente abrimos a 30 de Janeiro No meio das obras de remodelação do espaço e de caixotes com roupa, surge uma jovem a pedir ajuda. Uma jovem com poucos recursos financeiros que precisava de roupa apropriada para uma entrevista e não tinha como a adquirir. Claro que ajudámos: as portas da Dress estão sempre abertas para quem precisa da nossa ajuda.
À data de hoje já recolhemos quase 2500 peças. Recebemos roupas a título individual e pessoal, mas grande parte vem de acções realizadas dentro das seguintes empresas: CGD, Embaixada dos EUA, e CitiBank. Estão agendadas para os próximos dois meses recolha de roupa na Galp Energia e na Accenture.
Ainda não temos mecenas. É uma das peças fundamentais do crescimento do projecto em que estamos a trabalhar. Contamos que mulheres em postos de chefia nas áreas da solidariedade social, marketing e comunicação convençam as suas empresas da importância da nossa instituição e da oportunidade de relação com uma ONG internacional que pretende combater um dos maiores problemas dos dias de hoje: o desemprego.
Neste período quantas pessoas já ajudaram? 
Vestimos 48 mulheres, 35% das quais ingressaram no mercado de trabalho. E 40% voltaram a nós para receber mais roupas e continuar a apresentar-se ao trabalho. Maioritariamente estas mulheres são mães solteiras, com idades entre os 26-45 anos de idade, com imensas dificuldades financeiras e com muita vontade de trabalhar.
Para serem ajudadas, estas mulheres têm de estar activamente à procura de emprego e podem vir reencaminhadas pelos nossos parceiros: Fundação Aga Khan, Pressley Ridge, IEFP, Centros de Emprego, Juntas de Freguesia, Projecto Reklusa, Oblatas, Acidi, Triangulu, entre outros. Caso as mulheres venham directamente à Dress, têm de comprovar a existência de uma entrevista de emprego.
Por que chamam clientes às pessoas que ajudam?
Na realidade esta é a nomenclatura norte-americana.  Queremos que as nossas mulheres se vejam como clientes, que entram numa loja e adquirem roupa. A diferenca é que não têm de pagar nada. Não queremos passar a ideia do "pobrezinho".
Não cuidam apenas da imagem, pois ministram um Programa de Crescimento Profissional. Em que consiste?
Numa segunda fase as mulheres inserem-se no Programa de Crescimento Profissional (Professional Woman's Group). Oferecemos formação, por forma a que estas mulheres possam manter o seu posto de trabalho, crescer no mercado de trabalho. Damos ferramentas em consultoria de imagem e guarda-roupa, gestão do tempo, como gerir o seu dinheiro, como se manter em forma, o que são os recursos humanos de uma empresa, o que é uma hierarquia, formação em programas computadores, a internet como ferramenta de trabalho, entre outros. Os formadores são voluntários, que consoante a área da formação, são enviados pelos nossos parceiros.
Espera-se que as mulheres ajudadas pela Dress for Success retribuam a instituição no futuro? 
Não esperamos nada destas mulheres, a não ser o sucesso no futuro. Mas na verdade as nossas mulheres são extremamente solidárias. É rara a mulher que vem ter connosco e que não diga: "Gostava de ser voluntária da DFS, como posso ajudar as outras mulheres?" E contaremos com algumas delas um pouco mais à frente.

Mais informações aqui.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

O clube onde mulher não entra


O célebre casaco verde com a imagem do clube

Três meses depois de chegar à presidência da IBM, uma das maiores companhias americanas, Virginia (Ginni) Rometty descobriu que, afinal, ainda não conseguiu quebrar o tecto de vidro. Tradicionalmente o Augusta National Golf Club admite como membros homorários os presidentes executivos dos principais patrocinadores televisivos do torneio US Masters, o principal torneio de golfe. Mas ao contrário do que aconteceu com os seus três antecessores, a Virginia Rometty não propuseram a admissão ao clube – porque é mulher. O Augusta National Golf Club é um clube exclusivamente masculino, em que só em 1990 um afro-americano foi admitido.
Claro que qualquer clube privado, dir-me-ão, tem a prerrogativa de decidir (bem ou mal) quem são os seus membros. Mas esta visão é antiquada e perigosa: mulheres não entram; judeus são expulsos; negros à parte - já vimos isto na história e o resultado foi sempre condenável. É que não falamos do mesmo que um homem ver recusada a entrada num ginásio VivaFit ou numa associação de empresárias. O Augusta é um clube muito poderoso e influente. Um clube que recusa que as mulheres, mesmo as presidentes das maiores empresas americanas, tenham acesso à rede de contactos que se fazem quando os 300 líderes empresariais mais poderosos da América se reúnem nos seus greens.
Durante o torneio, que terminou a 8 de Abril, o presidente do clube, Billy Payne foi bombardeado por jornalistas questionando a possível admissão de uma mulher e sempre se recusaou a responder, reiterando que a política do clube é não discutir publicamente as admissões. Mais de 1/3 das 24 questões colocadas na conferência de imprensa de meia hora diziam respeito a esse assunto (como pode ler no site do clube, aqui). A pressão agigantou-se quando um porta-voz da Casa Branca afirmou que o presidente Barack Obama acredita que as mulheres devem ser admitidas no Clube, no que foi secundado pelo candidato presidencial repuublicano Mitt Romney. Pode ser que a discussão esteja a decorrer nas salas privadas do clube e que venha a acontecer no futuro próximo.
Mas o que causa maior estranheza é que Virginia Rometti, confortavelmente sentada numa pilha de dólares, aceite pacificamente. A executiva e a IBM deveriam manifestar a sua indignação e o seu protesto face a esta situação inadmissível e intolerável. Seria uma oportunidade de lutar, não só por ela mas por todas as mulheres. Afinal, Virginia Rometti não pode deixar de reconhecer que, ela própria, é herdeira do legado de luta e reivindicação de outras mulheres no passado. Perdeu a oportunidade de ficar na história como a primeira mulher membro do clube (que já soma 79 anos) porque lutou por isso. Afinal, Virginia Rometti até joga golfe.